quarta-feira, 2 de abril de 2014

A QUESTÃO INDÍGENA NO BRASIL




"Ora, o neto do branco é branco, o neto do negro é negro, mas o neto do índio é apenas “descendente”. As outras raças se reproduzem, se perpetuam, mas a nossa raça indígena degenera e logo desaparece. Destino ingrato que querem nos impor. “Alto lá! Esta terra tem dono!” (Sepé Taiaraju)




Dificilmente conseguimos abordar um tema da magnitude e da relevância que o tema proposto possui sem imbuí-lo um pouco de nossos próprios valores.

A veia de justiceiro que a questão indígena no país faz saltar em cada um de nós acaba ganhando forma e salta aos olhos de quem lê o que redigimos. Contudo, não é esta, a principio, nossa premissa maior vez que tentaremos abordar tal tema dentro do contexto histórico que o mesmo possui, convergindo na questão legal que suscitou e que hoje se luta para aplicar.

É fato que a população indígena ocupou nosso país, quase que em sua totalidade, nos primórdios de sua descoberta e que, não obstante, eram seus únicos habitantes. Também é fato que esse contingente populacional se reduziu a um percentual que hoje é praticamente insignificante se o comparamos ao inicial. É por este motivo que abordaremos tal tema dentro da perspectiva histórica que desencadeou a elaboração do Estatuto do Índio (Lei n° 6001/73) do Decreto Lei n° 1.775/96, da Súmula n° 650 do STF e os demais artigos da Constituição que versam sobre a preservação das áreas indígenas, de sua cultura e de seu povo.



Apenas uma breve  analise do contexto histórico.

Qualquer livro de História que se preze inicia sua aventura de narrar a História do Brasil a partir da desventura, por assim dizer, que foi a questão da apropriação lusitana (inicialmente), das terras pertencentes, utilizadas, cultivadas, ou mesmo habitada pelos povos indígenas com destaque para o elemento basilar e constitutivo da própria ocupação do país: a violência.
Isso ocorre quando do final dos séculos XVI, XVII e inicio do XVIII, se intensificando a partir do momento em que a Coroa portuguesa se decidiu pela colonização, através da adoção do sistema de Capitanias Hereditárias, da colônia brasileira. 
Ora, a simples entrega das terras aos chamados Donatários já implica necessariamente na idéia da posse dessas terras por parte da Metrópole bem como no não reconhecimento de qualquer outro dono para tal território, o que, tornava inviável, a presença dos “estranhos índios” nestas terras. Inicialmente tais estranhos foram expulsos do litoral devido à exploração da cana de açúcar e posteriormente, expulsos do interior devido à atividade pecuária.
Assim, acerca do tema, podemos ler no livro Uma nova História do Ceará, de organização da professora Simone de Souza, artigo do professor Francisco Pinheiro (2004):
À medida que a produção açucareira avança pelas terras do litoral, que se estendem da Paraíba até a Bahia, a pecuária, como sendo uma atividade subsidiaria da produção açucareira, foi sendo tangida para o interior. (...) Esse espaço livre para os grupos indígenas, que haviam gradativamente sido expulsos da faixa litorânea, foi-se transformando aos poucos em território da pecuária. (2004, pg. 18).
Como a idéia da posse também variava entre os habitantes do Brasil àquela época, com próprio conceito de terra ocorria o mesmo. Para o colonizador esta não representava nada além de um meio de produção enquanto que para os povos indígenas, era não somente o meio através do qual eles garantiam a sua própria sobrevivência bem como, simbolicamente, era a forma pela qual definiam sua própria identidade.
Porém, como todo bom civilizado que se dê ao respeito, os portugueses não só pouco se importavam com o significado que a terra tivesse para o índio, como queriam e impunham o seu modo de vida, crenças e valores não somente aos povos indígenas, mas, também aos demais cantos e recantos do mundo. 
Assim, definida estava a situação na colônia e o posicionamento que os índios deveriam tomar diante da Coroa, ou seja, ceder ou morrer! Acerca do tema, ainda assim podemos ler no livro Uma nova História do Ceará, artigo do professor Francisco Pinheiro (2004):
(...) a submissão dos povos indígenas ao modo de vida europeu,, que se fazia capitalista, implicava em trabalho sistemático na lavoura, em adoção de uma nova noção de tempo, que passa a ser marcado, nas aldeias, pelo sino da igreja; mas, sobretudo, adotar a noção de utilidade no sentido mercantilista era essencial. (pág. 19).
Neste sentido, dizer que esses modos de vida eram dispares é o mínimo. Dissertar acerca das gritantes diferenças nas concepções de mundo, de terra, de vida e de valor entre o colonizador e o indígena é extremamente redundante e vão diante do que de fato sabemos. 
O que de fato sabemos é que a imposição do modo de vida europeu levou ao extermínio de milhões dos habitantes nativos da América porque os valores do colonizador eram um atentado constante ao modo de vida desses povos. Violados em sua religião, em sua crença, em seus ideais, em seus costumes, na sua moral, no seu interior e em seu caráter esses povos quedaram, não inertes e não sem luta, mas sucumbiram ao poderio da religião, das balas e dos revolveres do superior homem branco. Ainda neste contexto vejamos o que nos diz Francisco Pinheiro de Souza em “Uma nova História do Ceará” (2004):
A terra, para os povos indígenas, não era vista como um modo de produção, na perspectiva mercantil de gerar lucros; ao contrário, deveria ser o espaço da liberdade e da possibilidade de viver sem serem constrangidos pelos brancos (...) Os povos indígenas, ao contrário de algumas abordagens, reagiram sim à invasão européia (...) desde a luta armada até a recusa à aceitação da catequese. (pág. 25).
Não sem luta, é verdade, mas sucumbiram. Entre as primeiras investidas violentas fracassadas, a tentativa de conversão ao catolicismo através da catequese e a negação de seus costumes para adoção de outros (os do colonizador) avançou a largos passos o processo de genocídio e etnocídio indígena e, como todos nós já sabemos o final dessa história, após pouco mais de 150 anos de domínio da coroa portuguesa sobre as terras brasileiras, os índios já não representavam (nem numericamente e nem belicamente) um empecilho aos objetivos da coroa. Sucumbiram de tal forma os nativos que o Brasil, antes completamente povoado por índios, hoje, não chega sequer a possuir os 12% de suas terras (legalmente estipuladas) habitadas por eles, os antigos donos, os primeiros donos. 
(Ana Peixe)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

AMENIZANDO A EXPLORAÇÃO: O DIREITO DO TRABALHO

Uma vez que o trabalhador (aquele que vende sua força de trabalho por ser esta a única e legitima fonte de subsistência de que dispõe para manter-se vivo, e, em assim logrando êxito, poder usufruir de tudo aquilo que faz com que a existência seja suportável) constitui-se, obviamente, como a parte frágil da relação trabalhista há que se vergastar alguns remédios jurídicos no sentido de tentar manter um “certo equilíbrio” entre ele e seu empregador. Um destes remédios atende pelo nome de CLT.
A CLT, em toda a sua honra e glória, resguarda alguns dos direitos que o legislador considerou inalienáveis, indiscutíveis e irrenunciáveis. Conforme todo o acima expedindo, reconhecemos que é única e exclusivamente através do trabalho, que o operário adquire aquilo que é o básico, o indispensável para a sua sobrevivência. E entendamos que a palavra Trabalho aqui se reveste de caráter alimentar, de indiscutível e única fonte através da qual a classe operaria adquire o mínimo necessário para seu sustento e, portanto, necessita de atenção especial.
Há ao longo de toda a história do nosso país registros incontáveis de exploração da classe trabalhadora. Conhecemos acuradamente a situação a qual a classe operaria foi submetida ao longo dos anos neste e em outros países do mundo. Jornadas de 18 horas diárias em condições sub-humanas, pouquíssima ou quase nenhuma condição de higiene no local de trabalho, nenhum tipo de estabilidade na “empresa”, diferença salarial entre homens e mulheres, trabalho infantil e etc. Enfim, todo aquele contexto que antecedeu a revolução industrial e que ainda se arrastou por vários e vários anos após os seus diversos níveis de desenvolvimento.
Visando a amenizar os devastadores efeitos da indiscriminada exploração da mão de obra da classe trabalhadora algumas providências legais foram tomadas e aperfeiçoadas com o decurso do processo histórico. A CLT é a mais importante delas, acrescida por diversas normas, jurisprudências e etc.
Bem, mas retomando, Valentin Carrion, no livro Comentários a consolidação das leis do trabalho, edição 2002, utiliza a afirmação de Perez Botija para nos dizer que aquilo que entendemos por Direito do Trabalho é nada mais que “um conjunto de princípios e normas que regulam a relações entre empregados e empregadores e de ambos com o Estado, para efeitos de proteção e tutela do trabalho.”
Ainda, neste contexto, vale ressaltar que a tentativa primeira, imediata mesmo, do direito aplicado às relações trabalhistas é a de manter a pessoa do trabalhador, bem como sua integridade física e moral, protegida dos desmandos e abusos que possam vir a ser cometidos por parte do empregador. Isso ocorre, conforme dissemos acima, porque há o reconhecimento de que geralmente, face a sua debilidade econômica frente aos grandes proprietários e empresários, o “operário” acaba por submeter-se aos seus ardis e imposições, em maioria esmagadora, escorchantes, aviltantes e que ferem de morte os valores e a moral do humanamente aceitável. Desta forma, tenta a Lei “corrigir” ou mesmo atenuar essas desigualdades inigualáveis, por vezes de maneira vã, fadada ao fracasso!
 Porém, e a bem da verdade, e esta seja dita, sabemos que se trata mais de uma tentativa desesperada de por ordem aos desmandos e impropérios das grandes empresas detentoras de capital neste país, que costumam agir de acordo com suas próprias leis, do que algo que realmente se preste ao papel de impedi-los ou evitá-los.
De qualquer feita, versam a lei, as normas e a jurisprudência pátria que a grande maioria dos direitos dos trabalhadores, adquiridos a duras penas, cacetadas, pauladas e bala, são caracteristicamente indisponíveis, ou seja, conforme Aurélio Buarque de Holanda, deles não se pode dispor, salvo negociação feita através ou com a presença de uma representação sindical.
Ora, os direitos trabalhistas adquiridos são indisponíveis porque se aderem, unem, entrelaçam-se ao único poder que o trabalhador possui que é a sua força de trabalho. E é ela o meio do qual se utiliza para garantir a sua sobrevivência, coisa que nem o legislador e nem qualquer brasileiro que aqui resida pode questionar.
Por Ana Peixe

terça-feira, 29 de março de 2011

ROUSSEAU E MARX: A EXPLORAÇÃO É HISTÓRICA

Karl Marx chamou em seus escritos de “força de trabalho” no patamar de bem inalienável, intransponível e indissolúvel, erigindo-os a mesma categoria daqueles garantidos pela Constituição no artigo acima citado, exatamente por acreditarmos que ela, a chamada “força de trabalho” possui um especial e indiscutível caráter alimentar e, como tal, torna-se indispensável à própria condição humana, em manter-se vivo”.
È cediço por cada um de nós com profunda destreza que o que move este mundo capitalista é a busca incessante pelo lucro. Neste sistema, muito mais que desumano, há uma gritante separação ente aqueles que compram “força de trabalho” e aqueles que, não possuindo outra alternativa, vendem a única coisa da qual dispõem: sua mão de obra.
Trata-se aqui, não somente de uma questão meramente ilustrativa ou alegórica, mas antes do reconhecimento de que neste mundo devastado e assolado pelo ininterrupto apartheid social, alguns (e, diga-se de passagem, “alguns muitos”) que não gozam ou usufruem daqueles privilégios fornecidos pela propriedade, pela posse, necessitam, desesperadamente, do básico, do indispensável à sobrevivência e, para tanto, submetem-se não somente a jornadas extenuantes de trabalho, mais ainda, o fazem em condições que vilipendiam, maculam e arrastam pelos tortuosos caminhos da injustiça tanto o artigo V da nossa Lex fori, quanto  todo o nosso ordenamento jurídico e, por que não dizer, a própria condição humana. 
É nesta relação, desde pronto injustificada e inexoravelmente desigual, que se constituem as relações trabalhistas em nosso país desde sempre!
Já no inicio do século XVIII, o renomado filósofo francês Jean Jaques Rousseau, em seu livro “discurso sobre a origem da desigualdade entre os homens” lançou a seguinte pérola: O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer isto é meu e encontrou pessoas suficientemente ingênuas para acreditá-lo. Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não poupariam ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: “Defendei-vos de ouvir esse impostor; estareis perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não pertence a ninguém.”. 1999, pág. 87. Talvez nem mesmo o próprio Rousseau soubesse o quão verdadeira e atual seria esta sua colocação uma vez que ela estabelece desde pronto um mundo cindido, partido e constituído por duas realidades absolutamente distintas: a dos que possuem e a dos que não possuem, a dos que tem e a dos que não tem, a dos pobres e a dos ricos, a dos dominados e a dos dominadores, a dos empregados e a dos empregadores.   
Corroborando ainda este argumento temos, alguns anos mais tarde a persona do inigualável sociólogo alemão Karl Marx que afirmava categoricamente: o capitalismo sempre esteve presente ao longo de toda a história da humanidade! Não obstante, esclarece que esse sistema não só se modificou e complexificou com o passar do tempo, mas sempre e sempre manteve a sua máxima de exploração e desigualdade social. O capitalismo avança através de seguidas crises uma vez que são elas, as crises, que sustentam e solidificam o próprio sistema.
Desta forma, a figura do que aqui chamaremos “empregador” ( aquele que personifica o poder através da posse de terras ou do próprio capital, e isso, é claro, dependendo do momento histórico, aquele que primeiro cercou o terreno, como nos diria Rousseau) sempre existiu, sempre esteve presente ao longo do desenvolvimento da história humana, bem como, tão antiga quanto ela e figurando no outro pólo desta desigual “queda de braços” é a figura do “empregado”, aquele que, não possuindo status quo, propriedades ou capital, vende a única coisa que lhe resta: sua força de trabalho.
Mister se faz esclarecer que todo o percurso que nos propomos a traçar até aqui (desde um breve apanhado do pensamento russoniano até uma singela analise do marxismo) é de fundamental importância para o tema ao qual nos propomos. Uma vez que a constituição do nosso sistema judiciário não é e não pode ser pensada desvencilhada do sistema político e econômico ao qual está submetida, não pudemos prescindir de reconhecer no sistema capitalista um dos grandes vilões de nossa história. Aliás, diga-se de passagem, nenhuma abordagem interpretativa ou mesmo que tenha a intenção de analisar de forma séria qualquer uma das esferas sociais, indiscutivelmente passa pelo reconhecimento da influência, iniludivelmente estrutural, do sistema capitalista.
Assim, temos estabelecida historicamente a dominação do forte sobre o fraco, sendo aqui denominado forte aquele que se constitui num patamar de detentor do poder econômico e que se faz valer sobre o financeiramente menos abastado.
Por Ana Peixe

sexta-feira, 25 de março de 2011

A NOSSA CONSTITUIÇÃO

A Constituição da Republica Federativa do Brasil, lei maior de nosso ordenamento jurídico, estatui em seu artigo V e demais incisos que são assegurados a todos os brasileiros e, até mesmo aos estrangeiros que aqui residam, o direito inalienável, intransponível, tais como: à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade em todos os seus termos. Tal artigo torna cada um de nós responsável, não somente por nossas existências, mas também assegura-nos a posse inquestionável daquilo que nos pertence simplesmente porque existimos.
Tudo aquilo que possamos comprar ou vender, emprestar ou doar, conforme a nossa vontade, desde que adquiridos dentro daquilo estatuído como legal e juridicamente aceito, nos é, acertadamente, assegurado pela Lei.
Considerando que nenhuma lei pode opor-se ou ainda sobrepor-se a nossa Lex Legum, é forçoso reconhecer que há por parte dos legisladores de nosso sucateado, mas amado país, a preocupação em assegurar o mínimo necessário para que gozemos da autonomia e da liberdade de que dispomos por sermos parte neste mundo.
Por Ana Peixe

terça-feira, 8 de março de 2011

A FIGURA DO LAÇADOR NA JUSTIÇA OBREIRA CEARENSE

O laçador no atual contexto de funcionamento da justiça do trabalho é uma figura tão conhecida como a do próprio reclamante:
Aurélio Buarque de Holanda nos diz que laçador é aquele homem destro no exercício de laçar, habilidoso no menejo do laço. Quisera nesta vasta língua uma palavra tivesse apenas um significado. Não que esta nomenclatura não se aplique ao laçador que aqui mencionamos, mas certamente não faz jus a todas as suas habilidades.
Sempre existiu nos arredores da Justiça do Trabalho alencarina, o fórum Autran Nunes, aquele que aqui chamamos laçador. Seu serviço consiste em abordar os trabalhadores mais desavisados e tentar lhes vender serviços de advogados. Geralmente muito habilidosos com o laço, ou seja, extremamente persuasivos, os laçadores (ou ainda atravessadores) prometem o sol e a lua aos trabalhadores mais ingênuos ( tais pagamento de 13 salário, férias, FGTS, aviso prévio, seguro desemprego e etc), convencem os reclamantes e os levam a advogados pré-determinados, percebendo, pelo serviço valores que variam conforme o grau de vinculação do trabalhador a empresa ou ao patrão.
Francisco Facó, advogado e poeta, militante a mais de 20 anos na Justiça do Trabalho, resume, com maestria, no poema transcrito a seguir, o que talvez não tenhamos conseguido fazê-lo com palavras comuns.
O Laçador
“Na Justiça do Trabalho, o obreiro aparece.
E, para “quebrar o seu galho”, o laçador se oferece.
Daí passa a correr riscos na mão deste infiel
Que a um causídico a risco, o vende a grosso, a granel.
Ouvido esse coitado, por “aético defensor”
Nem sabe que foi comprado àquele vil laçador.
Na presença do juiz, ao lado desse “doutor”,
“crente” esta de ser feliz o misero trabalhador.”

Não pensemos que medidas no sentido de coibir esse tipo de ação não tenham sido tomadas por inúmeras vezes, mas, conforme podemos verificar, nenhuma delas surtiu efeitos posto que seguem firmes e fortes, com estabilidade garantida, os laçadores desta comarca.

Por Ana Peixe